| Resenha  KRIEG-PLANQUE, Alice. A noção de "fórmula" em análise do  discurso: quadro teórico e metodológico. Tradução de Luciana S. Salgado e  Sírio Possenti. São Paulo: Parábola Editorial, Série Lingua[gem] 39, 2010, 143pp.   O livro  de Alice Krieg-Planque, originalmente publicado em 2009, pode ser considerado  como um ponto de convergência que materializa efeitos de sua tese de doutorado  defendida em 2000, que tratava da emergência, do emprego e da significação da  fórmula "purificação étnica" na imprensa francesa entre os anos  1980-1994 e do livro daí decorrente "Purificação  étnica". Uma fórmula e sua história (Ed. do CNRS, 2003), sobretudo no  que diz respeito à base teórico-metodológica que os sustenta.Na  introdução do texto, Krieg-Planque explicita que o livro, estruturado em cinco  capítulos, dedica-se teórica e metodologicamente à noção de fórmula,  designando-a como um conjunto de formulações. A fórmula assim compreendida  possui um funcionamento determinado pelo fato de que seu emprego é circunscrito  ao espaço público em uma conjuntura específica. Enquanto um conjunto de  formulações, a fórmula, nessa perspectiva, circula, sob a forma de suas  variantes, em momento e espaço públicos específicos constituindo e  cristalizando "questões políticas e sociais" (p. 9). Um dos exemplos  que a autora fornece de fórmula é "mundialização" cujas variantes  compreendem o seguinte conjunto de formulações: "mundialização", "globalização",  "mundializar", "globalizar", "antimundialização",  "antimundialistas", "altermundialização", "altermundialistas",  entre outras, lembrando que, muitas vezes, parte dessas formulações podem se  intercambiar produzindo o efeito de cristalização, como o par  "mundialização/globalização" (p. 9).
 Para  a autora, o estudo discursivo dessas fórmulas pode permitir a compreensão do  espaço público contemporâneo, sobretudo se pensado a partir das relações  sociais que o constituem; ela privilegia, nesse caso, o quadro espaço-temporal  estabelecido na virada do século XX para o século XXI.
 A  autora explica que o estabelecimento da noção de fórmula supõe um quadro  conceitual tributário de uma perspectiva pluridisciplinar – ciências da  linguagem, ciências da informação e ciências da comunicação – que abrange  "diversos horizontes das ciências humanas e sociais" (p. 9),  destacando aí certa escola francesa de análise do discurso. Ao operar  analiticamente com a noção de fórmula, Krieg-Planque sistematiza um trabalho  com, segundo ela, fenômenos de retomada e de circulação de discursos, citando  como seus exemplos, além das fórmulas, as "pequenas frases", os  "elementos de linguagem", os "argumentos" e os "slogans". É dessa maneira que  Krieg-Planque acredita que a noção de fórmula pode ser um "recurso fecundo  para a análise dos discursos políticos, midiáticos e institucionais" (p.  12), para fazer mostrar que esses discursos se constituem como "o  instrumento e o lugar (e não apenas a origem ou a consequência) das divisões e  das junções que fundam o espaço público" (p. 12). Mais precisamente,  segundo ela, as fórmulas permitem apreender discursos políticos, midiáticos e  institucionais (cf. p. 16).
 Dessa  maneira, a autora toma a fórmula como objeto que faz construir e circular  discursos; objeto por meio do qual os atores sociais podem organizar as  relações de poder e de opinião. Esses atores sociais desempenham uma ação sobre  essas relações e são associados, por exemplo, a diversas designações, podendo  ser identificados tanto com homens, mulheres, políticos, militantes de  associações, representantes sindicais, dirigentes de empresas, comunicadores,  jornalistas profissionais, intelectuais, etc. quanto com as direções de grandes  empresas e das administrações e com a própria mídia (cf. p. 118). Assim,  podemos dizer que a posição da autora é a de que as instituições, que tornam  possível o estado político, jurídico, sociológico e técnico, e o homem atuam no  espaço público por meio de suas ações sobre a fórmula, ou seja, pelo modo como  eles dela se apropriam, pelo modo como eles a manipulam discursivamente, já  que, em última instância, a fórmula, segundo Krieg-Planque, é uma  "questão" (p. 122) que, do modo como compreendemos, materializa,  fazendo convergir sobre si, uma problemática sociopolítica.
 No  primeiro capítulo, "da análise do vocabulário sociopolítico à delimitação  de fórmulas", ao discutir a noção de fórmula relacionando-a à noção de usos,  a autora defende a idéia de que a fórmula não existe "em si", mas se  constitui enquanto formulação de natureza lingüística (necessariamente, seqüência  verbal e suas variantes) que integra um conjunto de práticas linguageiras;  integrando essas práticas, a fórmula se constitui na medida em que seu emprego,  seu uso, o modo particular com que é utilizada se faz recorrente em um momento  e em um espaço público dados, determinando relações de poder e de opinião na  sociedade. A fórmula, dessa maneira, é composta de um conjunto de formulações  lingüísticas (unidades lexicais, léxico-sintáticas, sintáticas,  morfossintáticas, etc.) "formalmente delimitáveis e relativamente estáveis  do ponto de vista da descrição lingüística" (p. 14), cujo acesso à  condição de fórmula é parte integrante da história de sua utilização (de seus  usos).
 Assim  procedendo, a autora explicita que a análise de fórmulas – concebidas como  fenômenos discursivos constitutivos do discurso sociopolítico – poderia  constituir um campo de estudo conexo à lexicologia sociopolítica (nas palavras  dela, análises de usos sociopolíticos do léxico), debruçando-se sobre o  "decurso de um tempo durante o qual uma palavra (ou um sintagma, ou  qualquer outra seqüência verbal) se põe a funcionar no espaço público como uma fórmula" (p. 17).
 Para sustentar essa posição,  Krieg-Planque comenta uma série de monografias e artigos que se dedicam a  explicitar histórias de longa duração da "vida" de certas palavras  e/ou seqüências verbais pertencentes ao campo sociopolítico, tais como  "revolução", "classe estéril", "exclusão",  "racismo", "desenvolvimento sustentável", entre outras. Dentre  os trabalhos por ela citados e/ou comentados, destacam-se os de Alain Rey,  Simone Bonnafous, Marie-France Piguet, Maurice Tournier, Denise Maldidier e Jacques  Guilhaumou, entre outros . O  interesse nesses trabalhos está no fato de eles representarem um lugar em que  se torna possível "apreender os momentos em que dada palavra é objeto de um  uso particular" (p. 19). Para a autora, seguir o caminho dos usos de uma  dada unidade lexical (formulação) no tempo pode permitir a verificação do que  ela compreende como desvios de percurso, isto é, "episódio particularmente  movimentado da 'vida de uma palavra'" (p. 19), zonas de turbulência, fases  críticas, momentos de intensificação pelos quais uma unidade lexical atravessa  e que podem ser circunscritos analiticamente; enfim, correspondem a  circunstâncias em que uma "fórmula pode ganhar consistência" (p. 19).  Acompanhar esses desvios de percurso permitiria ao analista apreender, em  termos de sentidos e de processos de semantização, consensos, conflitos,  dominâncias, reviravoltas, difusão, produtividade, jogos, mudanças,  deslocamentos, passagens, polêmicas, associações, evaporações, diluições,  polissemia, etc. Nas palavras da autora, episódios como esse na história de  vida de uma unidade lexical podem constituir indício da conjuntura discursiva  que atribui a um termo seu estatuto "formulaico" (cf. p. 20).
 Além  disso, a referência a esses trabalhos de lexicologia sociopolítica  "contribuem para assentar a tese de um poder social do discurso e, de  modos bastante diversos, contribuem com a reflexão sobre a palavra como questão  política" (p. 27). Os trabalhos comentados também mostram amplamente, na  perspectiva de Krieg-Planque, que a estrutura lingüística que constitui as  formulações é, "se não sempre diretamente responsável, pelo menos sempre  parte pregnante da expressão dos acontecimentos e dos discursos que fazem sua  narrativa" (p. 29). Nessa medida, a estrutura lingüística se configura em  uma forma de acesso à materialidade discursiva que estrutura, por sua vez, as  relações de poder e de opinião. Essa estrutura comporta discursos, portanto,  valores, argumentos, engajamentos, podendo estar constituindo "o coração  de um debate político" (p. 31).
 No  segundo capítulo, intitulado "o trabalho heurístico de Jean-Pierre Faye: a  fórmula 'Estado total'", a autora discute, por um lado, a gênese da noção  de fórmula a partir da análise da obra do filósofo Jean-Pierre Faye,  pormenorizadamente do emprego da fórmula "Estado total" ("totale Staat") em Langages totalitaires .  Ao procurar estabelecer as condições de produção e de circulação das narrativas  produzidas por "ideólogos e atores do espaço político" (p. 34)  entreguerras, na Itália e sobretudo na Alemanha, Faye tinha como projeto  construir o que ele denominava "supernarrativa". A supernarrativa  consistia em um processo de conhecimento do espaço político que recorta fragmentos  dessas narrativas, desarticulando-as e rearticulando-as numa outra narrativa,  que visava, no caso de Langages  totalitaires, explicitar a conjuntura sociopolítica do período em questão,  a partir dos efeitos decorrentes do processo de constituição e circulação da  fórmula "Estado total". Para isso, Faye procurou minimizar a  utilização de uma metalinguagem científica em favor dos próprios termos  presentes nessas narrativas (linguagem-objeto). Foi o que aconteceu com o termo  "fórmula", empregado por Faye, ao aparecer em partes das narrativas  por ele investigadas, constituindo os dizeres de dois professores alemães, Carl  Schmitt e seu discípulo Ernest Forsthoff.
 Por  outro lado, nesse segundo capítulo, a autora mostra, a partir da obra do  filósofo, que a análise não deve desconsiderar o processo de gênese de uma  fórmula, como, por exemplo, a fórmula "Estado total". Para ela,  observar a gênese de uma fórmula significa "remontar ao fio condutor dos  significantes que carregam a fórmula, levando em conta também o fio condutor de  cada significante tomado individualmente" (p. 40). Isso permitiria ao  analista testemunhar as condições iniciais de circulação da fórmula e de sua  "história de vida", podendo observar aí, inclusive, tanto o modo como  ela se cristaliza socialmente quanto a sua eficácia, isto é, seu processo de  aceitabilidade no cenário sociopolítico. É assim que ela esclarece que as  fórmulas são apreensíveis à medida que circulam socialmente em discurso,  tendendo à cristalização – caráter este que lhes é constitutivo.
 Em  "a análise de Marianne Ebel e Pierre Fiala", terceiro capítulo do  livro, a autora se dedica a resenhar análises sobre a noção de fórmula dos  pesquisadores Marianne Ebel e Pierre Fiala, sobretudo em relação às fórmulas  por eles analisadas "Überfremdung" ("influência e superpopulação  estrangeiras") e "xenofobia". A partir do trabalho desses  pesquisadores, Krieg-Planque desenvolve a noção de fórmula com que opera  analiticamente em seus trabalhos, apresentando-a sistematicamente no quarto  capítulo. O trabalho de Ebel e Fiala torna-se importante para a autora na  medida em que estabelece duas propriedades fundamentais que caracterizam o  funcionamento da fórmula: seu caráter de referente social e seu caráter  polêmico. Além disso, Ebel e Fiala mostram que a fórmula é um objeto discursivo  que produz efeitos de sentido ao circular socialmente, circunscrito a formações  discursivas que se configuram como abertas, permeáveis e heterogêneas (conforme  assevera Robin ), o que contribui para o  refinamento dessa noção cara à análise do discurso francesa, que é a noção de  formação discursiva. É a partir do refinamento da noção de formação discursiva  que é possível pensar a fórmula transitando entre formações discursivas,  constituindo, desse modo, diferentes materialidades discursivas.
 Em  relação ao trabalho de Ebel e Fiala, que estabelece uma dicotomia entre  enunciados com valor de re (enunciados que atestariam o  caráter de referente social da fórmula, por se relacionarem a um conteúdo e a  um referente) e enunciados com valor de  dicto (enunciados que atestariam o caráter polêmico da fórmula, por se  relacionarem com seu modo de dizer), Krieg-Planque faz uma crítica: ela afirma  que essas categorias, embora dêem pistas de algumas características das  fórmulas, são insuficientes para descrever seu funcionamento.
 O  quarto capítulo – "propostas: as propriedades da fórmula" – é  dedicado à descrição das propriedades essenciais de uma fórmula: seu caráter  cristalizado, sua dimensão discursiva, seu funcionamento como referente social,  sua dimensão polêmica. São essas propriedades que parametrizam a constituição  do método de análise e, por conseguinte, do corpus.  Ao estabelecer essas propriedades como essenciais, a autora (p. 111) conclui  que a fórmula é uma "categoria fluida", "gradual", cujos  limites não são claramente identificáveis. Dessa maneira, inscrevendo-se numa  tradição de estudos weberianos, distanciando-se de Aristóteles, Krieg-Planque  afirma que as propriedades da fórmula a fazem significar num continuum que não é estritamente  delimitável. Ou seja, para que uma fórmula seja assim considerada é necessário  que essas quatro propriedades sejam mais ou menos atendidas. Não se trata de  pensar essas propriedades em termos de "presente" / "ausente"  na fórmula, mas em continua,  respeitando a assimetria que coloca em relação, na fórmula, de maneira mais ou  menos interdependente, cada uma dessas propriedades.
 O  caráter cristalizado da fórmula é, segundo a autora, condição necessária para  sua existência e é determinado por sua materialidade, ou seja, pelo fato de que  ela se sustenta numa forma significante relativamente estável, o que permite ao  analista seguir seus rastros, descrever os contornos de sua circulação. Nessa  perspectiva, a maneira como a fórmula se cristaliza, à medida que ganha  circulação na sociedade, se dá de modos diversos, o que apenas a análise pode  determinar, já que o tratamento da fórmula implica considerar o conjunto de  formulações e das variantes que a constituem. Além disso, é seu caráter  cristalizado que faz com que a fórmula funcione como um lugar-comum, "um  significante partilhado" (p. 74) no cenário de debate sociopolítico da  questão que ela propõe.
 Além  do caráter lingüístico do processo de cristalização de uma fórmula, esta deve  ser compreendida, conforme assevera a autora, como uma noção discursiva:  "a fórmula não existe sem os usos que a tornam uma fórmula" (p. 81).  É dessa maneira que a autora circunscreve a dimensão discursiva da fórmula,  isto é, essa dimensão é dada pelo modo particular com que a fórmula é utilizada  pelos atores sociais no espaço público. Disso decorre dizer que uma dada  formulação não "nasce" fórmula, mas pode adquirir esse estatuto a  partir de seus usos, do modo como constitui discursos. De nosso ponto de vista,  é aí que a autora explicita a noção de discurso com que trabalha.  Metodologicamente, o caráter discursivo da fórmula é também determinado em  análise, a partir de um corpus suficientemente amplo, nas palavras da autora "saturado de enunciados  atestados" (p. 89), entendendo-se por "saturado" um corpus de tal maneira enriquecido que o  aparecimento de novas formulações pode ser ignorado, isto é, descartado.
 Interdependente  à sua dimensão discursiva, a fórmula se constitui como um referente social.  Isso significa dizer, explica Krieg-Planque, que a fórmula pode ser tomada como  "um signo que evoca alguma coisa para todos num dado momento" (p. 92)  e num dado espaço sociopolítico. Seu caráter referencial lhe impõe um aspecto  dominante, que é relativamente conhecido por todos, configurando-se como  "passagem [mais ou menos] obrigatória dos discursos produzidos no espaço  público" (p. 112). Esse caráter referencial decorre de um processo de  publicização, que, como o próprio termo sugere, confere publicidade, torna  público um determinado signo, situando-o como atestado em diversos tipos de  discurso, "tanto orais quanto escritos, especializados e leigos" (p.  95). Nas palavras da autora, o caráter de referente social da fórmula coincide  com o fato de ela ser "um denominador comum dos discursos, de ela ser uma  passagem obrigatória" (p. 96), constituindo diferentes manifestações  discursivas no espaço público. É assim que a fórmula deve designar algo, algo  que remeta ao mundo, ainda que algumas regiões do espaço público e certos  locutores atuantes nesse espaço mantenham-se refratários ao seu uso.
 A  última propriedade apresentada pela autora é aquela que estabelece para a  fórmula seu caráter polêmico, que está associado ao seu caráter de referente  social, já que a polêmica se instaura justamente pelo efeito de denominador  comum e de território partilhado que a fórmula produz ao circular socialmente.  "A fórmula é portadora de questões sociopolíticas" (p. 100), que  podem ser "pouco questionadas [...] altamente problemáticas [...] medianamente  polêmicas" (p. 112). A autora explica, ainda, que o caráter polêmico da  fórmula se sustenta ao mesmo tempo no nível lingüístico (lexical,  morfossintático, sintático etc.) e no nível discursivo (usos feitos das  formulações lingüísticas). Metodologicamente, a análise do caráter polêmico da  fórmula, segundo o que nos ensina Krieg-Planque, deve privilegiar os pontos nos  dizeres dos atores sociais em que, segundo ela, é possível identificar  "tropeços" (p. 105), ou seja, "operações metadiscursivas" (p.  108) relativas às fórmulas, como, por exemplo, os comentários que os locutores  fazem relativamente ao modo como uma dada fórmula aparece significando no seu  dizer.
 O  quinto capítulo, "sobre a noção de fórmula:  síntese, deslocamentos, questões", sumariza a discussão presente nos  capítulos anteriores, justificando teórica e metodologicamente o termo  "fórmula", apontando precauções em relação ao emprego dessa noção  analiticamente, explicitando o laço entre a noção de fórmula e a de espaço  público e, finalmente, questionando o papel das mídias na criação e na  circulação das fórmulas. Destacamos aí sua compreensão acerca do espaço  público. Para ela,
 o  espaço público não existe independentemente do princípio de publicidade, por  meio do qual os atores compartilham seus pontos de vista, expõem suas opiniões  em praça pública, tornando-as, desse modo, visíveis a quaisquer outras pessoas,  alimentando, assim, a possibilidade de um debate público e contraditório de  suas opiniões. [E em consonância com Jean-Marc Ferry]  "o  'espaço público', num sentido amplo, é o quadro 'midiático' graças ao qual o  dispositivo institucional e tecnológico próprio às sociedades pós-industriais é  capaz de apresentar a um público os múltiplos aspectos da vida social". O  espaço público é configurado pelos procedimentos de publicização que tornam  possível o estado político, jurídico, sociológico e técnico de determinada  sociedade. (p. 114-115) Ao  compreender o espaço público dessa maneira, Krieg-Planque explicita a  necessidade de relacioná-lo ao modo como as grandes mídias – imprensa, rádio e  televisão, e, contemporaneamente, a internet – configuram-se aí enquanto atores  capazes de organizar a constituição e a circulação das fórmulas. Dito de outro  modo, para a autora, as mídias se constituem como "plataformas de lançamento  privilegiadas das fórmulas" (p. 118), e é assim que elas desempenham algum  papel no seu processo de constituição e circulação na sociedade, com ênfase  para este segundo processo (o de circulação), já que elas operam,  fundamentalmente, na publicização das fórmulas.Nesse  trabalho, como mostramos, Krieg-Planque dá pouca visibilidade às suas próprias  análises, àquelas que encontramos em sua tese de doutorado, bem como no livro  dela decorrente. Nesse percurso, em que ela procura sistematizar um quadro  teórico-metodológico que sustente a análise do que ela denomina  "fórmula", no âmbito dos discursos constitutivos do espaço público, a  ênfase é sobre os discursos produzidos sobre a materialidade lingüística, em  suas múltiplas formas. Podemos perguntar se o domínio da fórmula é estritamente  lingüístico, uma vez compreendida como um fenômeno discursivo. Noutras palavras,  parece-nos razoável justificar a necessidade de se pesquisar fórmulas que  ganham circulação e que significam o social e o espaço público tendo como  suporte a imagem, o som, enfim, outras materialidades significantes. Além  disso, a leitura do trabalho instigante de Krieg-Planque nos coloca uma falta:  a história. Pensada como um fenômeno discursivo, a fórmula, nesse trabalho pelo  menos, é definida substancialmente em relação ao que a autora denomina  "atores sociais" atuantes no espaço público e ao "uso" que  esses atores fazem ou permitem das fórmulas. Metodologicamente, a autora não  explicita de forma suficiente em que medida esses usos são ou não  historicamente determinados, ou seja, em que medida as condições de produção  dessas fórmulas permitem certos usos e não outros, independentemente da vontade  e do controle desses atores sociais. A leitura, com isso, nos faz perguntar  pelo efeito do político sobre o modo como a fórmula significa o espaço público.
 Há,  ainda, um ponto em que a leitura do trabalho de Krieg-Planque é produtiva à  reflexão: ao compreender a fórmula como um conjunto de formulações e, ao mesmo  tempo, dado seu caráter de referente social, como signo "partilhado por  todos", estaria a autora postulando a fórmula como o lugar do sentido – o  lugar da questão do debate?
   Eduardo Alves RodriguesDoutorando em Lingüística/bolsista CAPES  da UNICAMP
 Gabriel Leopoldino dos SantosDoutorando em Lingüística/bolsista  FAPESP da UNICAMP
   Notas 
        
            A autora disponibiliza uma  vasta bibliografia pluridisciplinar para pensarmos a questão das fórmulas (cf.  pp. 123-137).  
            FAYE, Jean-Pierre. Langages  totalitaires. Critique de la raison/l'économie/Narrative. Paris:  Hermann, 1972. 
            Essas narrativas  correspondem a dizeres – textos, discursos e outros materiais – produzidos  pelos mais diversos "narradores", isto é, atores do espaço  sociopolítico em atuação no período considerado. 
            ROBIN, Régine. L'analyse du discours entre la  linguistique et les sciences humaines: l'éternel malentendu. In: Langages (Paris: Larousse), n. 81,  março, p. 121-128. 
            FERRY, Jean-Marc. Les puissances de l'expérience: Essai sur l'identité contemporaine, 2 vols., Paris: CERF, 1991.      |